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terça-feira, 10 de julho de 2012

Décadence Avec Élégance



       Eu quero que você olhe para mim e sinta pena. Que se angustie diante de minha coita injustificável, e que venha, quando eu estiver num canto isolado da sala, me perguntar o que há comigo.
    Vivo pra fazer com que todos se lembrem de mim como aquela que precisa de companhia, de apoio e de consolo.
    Estou sempre insatisfeita com as unhas, com o corpo, com o emprego, os homens e o cenário político mundial.
    Reclamar é uma boa maneira de puxar assunto. Por isso, o clima também é sempre vítima das minhas lástimas. Se sol, chuva, frio desnorteante, ou calor insuportável, tanto faz. É preciso que haja qualquer coisa de notável no ambiente pra que eu possa argumentar e convencer de que, definitivamente, aquela é a pior das estações.
    Meus pais, meus vizinhos, o controle remoto da minha televisão e a minha dor de cabeça são imbatíveis. Não discuta comigo. Não tente superar os meus problemas. Não me diga que as coisas vão melhorar.
Tudo o que eu quero de você é atenção. Importe-se mais com meus planos que não vigoram do que com sua própria vida, afinal, eu sempre sou a injustiçada em tudo.
    Se o julgamento favorece o réu, eu sou o acusador. Se meu time está perdendo, a culpa é, invariavelmente, do juiz, que se vendeu para o time adversário. Se perco o emprego, é por conta de o patrão não entender minhas causas perdidas. Nem todo mundo se predispõe a mudar o mundo como eu, da tela de um computador, num blog com “posts” críticos e com muito embasamento, claro.
    Gosto quando vêm me perguntar como vai a vida. Um momento único para o deleite das minhas desolações.  “’Tudo’ bem” é coisa demais. No impulso, a gente acaba se esquecendo de mencionar o vira-latas que sempre derruba o lixo, esquecemo-nos da fome mundial e de que na semana passada a empregada derrubou aquela porcelana importada caríssima que ganhei de mamãe. “Bem”? Boa deve ser a vida de quem não tem mais o que fazer!
    Sou tão boa companhia que as pessoas sempre me procuram aos domingos. É quando sentamos em alguma varanda – de preferência muito bem decorada com “futon” em cores pastéis - para comentar o sábado vulgar e indecente de algum conhecido, para lamentar a proximidade com a segunda-feira, e o término do final de semana.
    Gosto tanto da caridade visual que se derrama sobre mim quando digo que meus relacionamentos amorosos nunca dão certo, que faço questão de colecionar testemunhos tristes, traições hollywoodianas, e dramas shakespearianos.
    É muito bom ser o centro das atenções. Muito bom saber que ninguém acha que eu tenho expectativa de felicidade. As pessoas são piedosas com quem é ingênuo, e eu sou a minha melhor vítima.
    É um esforço diário alimentar minha coita. Preciso me esquecer da esperança todos os dias, e lutar para que a minha infelicidade contamine a quem se aproxima de mim.
    Tudo isso pra quê?
Não sei. Deve ser porque o niilismo exige menos complexidade do que o otimismo. A solidão é um prato cheio para uma satisfação completa diante de qualquer nova companhia. A dor dos outros é o ópio de todo curioso.
    Ainda bem que toda semana tem domingo!


Sarah Nadim de Lazari
#2012

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