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terça-feira, 30 de abril de 2013

Como Vai Você?


Se perguntarem por mim, diga que eu vou bem.

Diga que tenho meus planos maciços e meus rumos premeditados.

Diga que estou focada e que qualquer tropeço servirá de impulso para me ajudar a chegar ao meu destino.

Se perguntarem, diga que eu fui ali tratar de ser feliz, e que já volto.

Que tenho levado calada, e que vozes agudas demais me enchem o saco.

Que a família vai bem e que o cachorro, apesar de pentelho, é uma companhia irrefutável.

Diga que a saudade às vezes aperta, mas que finjo que ela não existe para que eu não seja perturbada no meu estado de nada.

Se perguntarem, conte sobre minha moda solitária e sobre o meu tênis sujo.

Diga que vou muito bem quando a cerveja está suficientemente gelada.

E que a carência é só uma premissa que consta entre o décimo sétimo e o vigésimo primeiro dias do meu ciclo menstrual.

Se perguntarem por mim, diga que eu mudei, mas que se um dia me encontrar por aí, ainda verá a mesma pessoa sob minha pálpebra caída.

Diga que eu engordei, mas que tudo bem, afinal de contas, eu tenho estado muito ocupada cuidando de coisas mais importantes.

E que eu estou descuidada, mas que com um “blush” e um “rímel” tudo volta a ser como se espera.

Se perguntarem por mim, pode dizer que estou solteira há 3 anos, e que me desculpo com a posteridade por estar tanto tempo satisfeita só com a minha companhia.

Diga que sou egoísta e que não gosto de dividir a cama, os travesseiros, o oxigênio do meu quarto e as filosofias inúteis que tenho pensado.

Que lavo muito bem as mãos e que escovo os dentes, religiosamente, 5 vezes ao dia.

Diga que tenho medo de muita coisa, e que meu grande herói é o porteiro, especialista em matar insetos horripilantes.

E que tenho uma planta artificial linda enfeitando minha sala de estar.

Se perguntarem, conte das minhas noites infindáveis de leituras saudosistas e pretensiosas sobre os amanhãs.

Que pretendo ser sempre muito melhor do que eu.

Que mantenho uma alimentação saudável na medida do possível, porque vi na TV que comer fibras iria me fazer viver para sempre.

E que tenho evitado todo tipo de lembranças para não me perturbar sobre quem eu era antes de ser um algoz para mim mesma.

Se perguntarem por mim, diga que morri.



Sarah Nadim de Lazari


segunda-feira, 29 de abril de 2013

Dele(i)te

Deletei o facebook.
Já não vêem mais minha "face".
Tenho um "book" pra compartilhar.

Deletei o facebook.
Não me lembro como eu era.
Preciso de alguém pra me contar.

Deletei o facebook.
Deletaram-me de suas vidas. 
Substituíram-me por umas curtidas. 

Deletei o facebook.
Esquecem de me convidar.
Esquecem de me parabenizar.

Deletei o facebook.
Permito-me sentir saudades.
Aprecio a vida com um novo paladar.


Brincadeirinhas de um "nada pra fazer".
Sarah Nadim de Lazari.



Um Gole de Cicuta


É estranho não participar das marés modais e morais que vão e vêm para as pessoas. Ser diferente é pejorativo hoje em dia. Não referindo-se a cor, credo ou sexualidade, mas às concepções do que deveras é o certo nas condutas cotidianas.

Por que é que insistem em se martirizar por não ter um tênis de marca refinada? “Refinada”.

Por que usar uma blusa cuja estampa é um rótulo em cores gritantes que se autoafirmam usando as pessoas de vitrine?

Quanto custa a sua intimidade e o sua individualidade, se tudo pelo que você lutou até hoje virou um penduricalho compartilhado entre várias pessoas?

Ter um celular com utilidades mil tornou-se, de um dia pra outro, indispensável. O mundo pautado pelo digital é uma corrosão à autenticidade e à realidade.

Não mais deleita-se de vida. Conecta-se a um universo paralelo, a um modo automático de existência que dirige as personalidades pelo que elas postam em seus perfis sociais.

Viramos um livro de receitas de nós mesmos. Compartilhamos com o mundo aquilo que ouvimos, comemos, dançamos, para onde vamos, ou de onde viemos, como se procurássemos alguma aprovação. Alguém que vá nos degustar e recomendar-nos como uma boa pedida.

Temperamo-nos com títulos, marcas e padrões que, de tão uniformizados, nos torna insossos.

A necessidade de ter e de ser aquilo que todo mundo tem ou é, me dá medo.

Não é de hoje que se escuta dizer que há um veneno certo contra determinado tipo de praga.

Se veneno a personalidade, praga a futilidade.


Sarah Nadim de Lazari